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Penhorabilidade das parcelas salariais da restituição do imposto de renda

* Wagner Moura

O tema da impenhorabilidade é de discussão inerente ao processo de execução. Sempre que se busca a satisfação material do direito subjetivo decidido em procedimento cognitivo exauriente volta-se aos limites jurídicos da atividade executiva, isto é, à profundidade dos atos materiais de constrição dos bens do devedor.

É, pois, a questão da impenhorabilidade ponto nodal do processo executivo, vez que reafirma até onde pode o juízo adentrar no patrimônio do devedor para satisfazer o crédito objeto do título executivo.

Dentre os bens excluídos da penhora se encontra a remuneração recebida pelo devedor a qualquer título para o sustento próprio e de sua família. É a verba de cunho alimentar que satisfaz a garantia de vida digna do executado e demais entes familiares (art. 649, IV, do Código de Processo Civil – CPC), estando, portanto, excetuada do processo executivo de constrição em qualquer grau de recebimento, ou seja, quer de forma direta ou indireta – como no caso da restituição do imposto de renda pago sobre o acréscimo patrimonial que provém de verbas salariais, restituição está que se torna impregnada da qualidade do bem que a origina.

Nesse sentido o Superior Tribunal de Justiça já conduziu por diversas oportunidades seus julgados, afirmando que só se admite a penhora da devolução do imposto de renda acaso ela advenha de acréscimo não alimentício, isto é, de parcelas que extrapolem as recebidas a título remuneratório ou salarial.

Contudo, recente decisão do colendo Tribunal alterou tal interpretação e reascendeu o debate sobre a possibilidade de penhora das parcelas remuneratórias do executado. No acórdão do REsp n°. 1.059.781/DF, a 3ª Turma decidiu que os valores oriundos de restituição de imposto de renda podem ser objeto de penhora quando não se mostrem necessários à sobrevivência do devedor, quando então perdem sua natureza alimentícia e escapam à proteção do art. 649, IV, do CPC.[1]

A decisão, fundamentando-se no princípio da efetividade, considerou aptas a satisfazer o direito creditício as parcelas que, embora a princípio de natureza alimentar, não foram consumidas integralmente para os suprimentos da necessidade básica do executado. Assim, consideradas foram, no caso concreto, dispensáveis à manutenção da vida digna do devedor e, então, penhoráveis.

É preciso cautela com a aplicação do entendimento firmado no recurso especial citado. Se por um lado assegura-se a efetividade da execução e a satisfação do crédito exeqüendo, tal objetivo é atingido à custa da proteção legal dos bens mínimos do executado, inclusive daqueles destinados à sua sobrevivência mínima.

Todavia, a preocupação maior reside na possibilidade de ampliação dos fundamentos do acórdão a casos análogos, ou seja, na penhora de bens de natureza remuneratória não consumidos na sua totalidade mesmo quando não advindos da restituição do imposto de renda, fato que violaria frontalmente a teleologia do art. 649 do CPC.

Se é verdade que o processo executivo é fundado na necessária proporcionalidade entre a satisfação do exeqüente com o menor gravame possível ao executado, as possibilidades de mitigação das garantias legais de impenhorabilidade devem ser aplicadas restritiva e excepcionalmente, assegurando os interesses do credor sem comprometer o indispensável ao devedor.


[1] STJ, REsp 1.059.781/DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, 3ª T., jul. 01/10/2009, DJe 14/10/2009.

 

* Wagner Augusto Moura e Silva é advogado no escritório NeriOliveiraLellis em Belo Horizonte – MG